Funeral aéreo

Fiquei um tempo sem escrever nada aqui, mas vamos tocar o barco. As convenções sociais-digitais não me comovem, não quero fazer deste blog mais um espaço para elas. Não há compromissos de frequência ou continuidade nesse espaço experimental, mas tentarei não relegá-lo à dispersão total.

Então vamos lá, transformar minha bile negra em combustível para essa máquina sem forma, fazer do niilismo um fator de criação, não um poço para se afogar. Segue um escrito meu que passo do papel pro virtual:

No frio e no tempo

dente de paquiderme

na encruzilhada dos ateus

deuses de fosfeno

na dança do esquecimento

pesquisas epiléticas

gramática nervosa

o horizonte vibra

se descondensa na neblina

descortina os segredos

do nada absoluto

remando asas de abutre

razão dilacerante

bico devorador do pensamento

autópsia de um morto-vivo

máquina social no coração do abismo

miragem no enxofre

bafo de vulcão

numa existência vulgar

resistência fugaz

sem âncora e sem mar

funeral aéreo

a catástrofe da paz




[ No Tibete há uma prática mortuária que consiste em oferecer os corpos dos mortos aos abutres num ritual de transmigração. Esse é o funeral aéreo (sky burial). ]


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