A antena da farsa


É demencial. Parece que aqui não precisamos de um ataque terrorista para atualizar o papel do inimigo. Aqui o papo do século XX de ameaça comunista ainda cola. Essa histeria macartista tão ultrapassada ainda está viva e respira, como um miasma infeccioso. Hoje propagado por robôs virtuais, perfis fakes e máquinas de likes, inteligências artificiais da propaganda violenta, verdadeiros vetores da desinformação. Armas criadas nas últimas eleições para automatizar e otimizar a proliferação da publicidade política, dos boatos, da difamação e que ainda estão em ação. [1]

Hoje os países de terceiro mundo, referido com o eufemismo higiênico de países em desenvolvimento, não precisam ser alvos de ataques de falsa bandeira, golpes de estado violentos, invasão militar - talvez no Oriente Médio e na África, né? - mas para manter a hegemonia, as potências ocidentais tem métodos mais eficazes e adaptados para subjugar e desestabilizar regimes nacionais que não acatam às suas políticas de submissão aos bancos e fundos monetários internacionais e seu escudo ideológico da teoria neoliberal. Qualquer sinal de intervenção do estado já é o suficiente para mobilizar as forças histéricas do anticomunismo, onde essa retórica ainda pode funcionar. A economia é capaz de subjugar porque cria desespero, amplificado pela mídia para mobilizar o povo para pedir por uma solução - e a solução não é nada mais do que o plano original: manter a ordem estabelecida, atualizá-la, melhorá-la, dar uma limpada. [2]

A Segunda Guerra nunca acabou. Porra, na real a Primeira não acabou. Ela só se sofisticou, ficou mais cirúrgica, terceirizada, localizada fora do jardim onde as crianças brincam. O capital financeiro e seus mecanismos são a evolução lógica para o domínio geopolítico e econômico global. O movimento de desregulação não tem como objetivo criar um livre mercado para o cidadão comum empreender, ele serve para afrouxar as toscas amarras que constrangem com impostos e direitos sociais as grandes corporações - que são as maiores parceiras, ou melhor, usuárias do estado. A burocracia e o capital, as finanças e as leis são elementos afins que se misturam para manter a estrutura hierárquica da plutocracia internacional. A desestabilização político-econômica da América Latina é uma política de longa data, desde a doutrina do Big Stick, o Cacetão. Ela é muito mais fácil quando o próprio sistema político desses países é composto por oportunistas que agem apenas por seus interesses e de seus patrões que não tem nenhum constrangimento em participar da derrocada das próprias instituições democráticas que ele supostamente representaria. [3] [4]

Ideologia é uma substância pegajosa que está espalhada por tudo. Ironicamente, aqueles que se dizem independentes, apolíticos, livres de ideologia estão cobertos dela. Falo desses que acreditam que estão lutando contra o mal encarnado na figura da corrupção encarnada na figura de um partido, daqueles que se dizem contra todo partido e não percebem que não existe aí nada de novo. Forças reacionárias e anacrônicas com um discurso anticomunista decrépito não se veem como inseridos no espectro político. Se veem como vanguarda, como moralização, como uma terceira via. Essa primavera populista encapsulada na fina flor que chamamos fascismo. É assim que funciona, assim que funcionou. E eu aqui, no meu barco furado, não falei nada sobre isso nesse blog até o momento derradeiro onde o processo político do impeachment da presidente se concretiza. Omisso? Talvez. Isentão? Não tenho essa ambição. Todo esse teatro deprimente da democracia representativa me dá náuseas não é de hoje. Capítulos de novelas institucionais, escândalos de personagens parlamentares, tudo isso é tão enfadonho e maçante. Não digo que não é importante. Mas é uma questão de onde você quer focar seu olhar. Eu procuro enxergar o contexto geopolítico em que esse teatro nacional acontece. A configuração macroeconômica do mundo, as redes de inteligência, a indústria da guerra, a aglutinação das oligarquias que usam seus mecanismos de poder para prevalecer no topo. Não é um governo de centro-esquerda que já tomava medidas econômicas neoliberais que iria frear isso, mas o momento internacional é urgente. É preciso suprimir qualquer ameaça de autodeterminação de qualquer povo ou nação, democracias são fantoches para os mesmos senhores.

Escrevi esse texto mais por pressão. Uma pressão atmosférica que exala da TV, que transmite simultaneamente para milhões de lares transfixados pela fascinação da grande política em ação. Auge da civilização. Os delírios presentes nesse site, a poesia, a cultura, o sonho, não são alienados de seu contexto. Quem o lê, sabe. E é por isso que me dedico aqui mais a eles, pois por mais etéreos que pareçam, são mais duradouros que os poliedros da justiça e os palácios da política e seus palhaços sem lírica. Estejamos atentos ao jogo, mas com uma perspectiva estratégica. Perceber o movimento das peças e a que mãos estão ligados os dedos que as movem. E destas mãos, procurar as articulações, veias e ossos que compõe os seus membros. O corpo social do mundo é um mapa imenso, e ser um dos anticorpos de seu sistema imunológico não é o meu papel. Faço daqui uma cartografia de meu ponto de vista de urubu mecânico, respirando ares mais rarefeitos que melhor me satisfazem, atento à pulsação das ruínas.

[1] apublica.org/2015/06/a-direita-abraca-a-rede/
[2] outraspalavras.net/brasil/o-brasil-no-epicentro-da-guerra-hibrida/

[3]
http://www.globalresearch.ca/regime-change-in-brazil-right-wing-protest-movement-funded-by-us-billionaire-foundations-training-in-us/5515204
[4]
midiacoletiva.org/sobre-kim-kataguiri-e-agenda-para-vender-o-brasil/

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